Bate-Papo com o luthier Ricardo Lelis (Wing Guitars)
Há cerca de cinco anos, após enfrentar um
período de desemprego, o engenheiro civil Ricardo Lelis resolveu apostar em seu
sonho – produzir instrumentos musicais. Para tanto, adquiriu uma máquina CNC e buscou
aperfeiçoamento profissional, estudando e dialogando com profissionais mais
experientes que já atuavam no mercado da luthieria. Começava assim a história
da Wing Guitars, empresa sediada em Mogi Guaçu/SP, que fabrica guitarras,
contrabaixos e violões customizados com muito carinho, precisão e atenção aos
anseios dos clientes.
Logo abaixo você poderá conferir a entrevista
que fizemos com o Ricardo, que nos contou um pouco sobre o seu envolvimento com
a luthieria, surgimento da Wing Guitars, serviços que oferece aos consumidores,
novidades para 2020, dentre outros assuntos.
Por
Álvaro Silva (ahfsilva@gmail.com)
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Clique sobre as fotos para melhor visualização.***
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Guitarras Wing em produção. |
Como surgiu a Wing
Guitars?
Ricardo
Lelis:
Sempre fui apaixonado por música, artes, criações e, em especial, guitarras.
Trabalhar com madeira também era algo que me atraía. Com a crise de 2014, a
minha área profissional (engenharia civil) e a empresa em que eu trabalhava
sofreram forte impacto com cancelamentos de obras. Não demorou muito tempo e
fui demitido. A luthieria pra mim era algo distante ainda, vista somente por
YouTube, até que descobri um luthier em minha cidade - o Fábio Gonçalves, que hoje
considero como meu mestre, embora quem me passou os primeiros conhecimentos na
área foi outro luthier de minha cidade - o Rogério Biazotto, que constrói
violas e violões. Com este, construí meu primeiro violão. Mas eu queria
mais, queria construir uma Les Paul. Com o tempo livre, e em um pequeno cômodo
no fundo de casa, fui aprendendo muito na base de erros e acertos, contando com
poucas ferramentas, muitas leituras, muitas horas de conversas com o Fábio
Gonçalves e visualização de vídeos. Além disso, fiz um curso excepcional com o
João Cassias, que é uma referência no ramo.
Acabei comprando uma máquina CNC sem saber ao
certo o que era e para qual finalidade usaria. Sabia trabalhar muito bem com
desenhos e meu primeiro desafio foi produzir o tampo de uma Les Paul. Quando
fiz o primeiro, achei o máximo o resultado, mas hoje, com a experiência, vejo
que existiam muitos erros. Logo depois, saiu a primeira guitarra de cedro com
tampo de imbuia, escala em jacarandá e braço em mogno, modelo Les Paul. Uma
grande conquista! Fui tentando outros modelos como a Tele e a Strato. Todas com
muitos erros, mas também com muitos acertos e, principalmente, muito
aprendizado.
Com o mercado da engenharia em péssimo
momento, e com as primeiras construções de guitarras, a ideia de criar uma
empresa de construção de guitarras e violões foi amadurecendo. E isso foi muito
sério para mim, dormia e acordava pensando só nas guitarras, nos projetos, nos
processos, nos erros e nas melhorias a implantar. Com o nome sugerido por minha
cunhada Grace, nasceu a Little Wing Guitars. A logo e as asas estilizadas
representando a letra W foram criadas por mim, e supervisionado pela Grace que
trabalha com propaganda e marketing. Criei páginas no Instagram e no Facebook,
e comecei a vender corpos de guitarra no Mercado Livre. A primeira venda foi um
corpo de Telecaster em marupá.
Com o crescimento da marca, e as vendas
aumentando através das redes sociais, e principalmente, com a evolução da
qualidade do nosso trabalho, alteramos o nome para Wing Guitars, mantendo as
asas estilizadas, que teve uma agradável e surpresa aceitação no mercado.
Atualmente, ainda divido as obras da Engenharia Civil com as construções das
guitarras, mas a meta é ficar somente com as guitarras. É uma paixão que me faz
não reclamar mais das segundas-feiras, nem comemorar a chegada dos finais de
semana e feriados. Estar na oficina construindo é um prazer para mim. Se
pudesse ficava com todas as guitarras que construo, não entregaria nenhuma.
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Guitarra Wing modelo PRS. |
Quais são os serviços
que a Wing Guitars disponibiliza para o consumidor atualmente?
Ricardo
Lelis:
A ideia hoje é manter ao máximo os serviços de customização. O cliente escolhe
o formato, peças, madeiras, modelos que sonha. Construo a peça e entrego da
forma que o cliente quiser, ou seja, se quiser somente o corpo da guitarra, ou
corpo e braço, ou somente o braço, ou o corpo e braço colados, corpo e braços
com acabamento (pinturas), guitarras montadas com hardware e eletrônica
instalada etc. Não fornecemos as peças de hardware e eletrônica por dois
motivos: primeiro, os representantes dos produtos oferecem preços e condições
de pagamentos melhores do que eu posso oferecer; segundo, se eu fosse
representante de algumas marcas, limitaria a customização e eu não gostaria que
fosse assim. Desta forma, caso o cliente queira, é só enviar todas as peças que
retornamos a guitarra montada e regulada.
Não trabalhamos com venda no balcão. Meu
balcão são as redes sociais e o WhatsApp, e meus clientes são de todo Brasil.
Assim tento ao máximo deixar o cliente mais próximo de suas construções com
postagens de fotos e vídeos durante o processo de fabricação. Se estes momentos
são prazerosos para mim, imagina pra quem está vendo seu sonho se tornar
realidade? Sinto-me muito bem em fazer parte disso.
Como a formação
acadêmica em engenharia civil contribui no seu cotidiano como luthier?
Ricardo
Lelis:
Além da graduação em engenharia, tenho MBA em gestão de projetos. Hoje sou eu
quem desenho todos os projetos em CAD. Com os projetos feitos, envio para o
cliente para aprovação. Este é o momento que ocorre o maior número de revisões,
pois quando começa a construção, alguns processos não podem voltar atrás. Uma
ótima ideia em um momento errado complica um pouco, embora seja comum. Mas
imagino que estas etapas não são exclusivas da engenharia. A minha formação
hoje ajuda nas escolhas para o caminho da Wing Guitars, o certo e o errado,
como tomar a decisão correta e em qual momento. A Wing Guitars é bem melhor que
ontem, com sonhos e metas para o amanhã, com muito espaço para crescer e
melhorar. Estamos correndo atrás disso.
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Les Paul Wing Goldtop em fase final de acabamento. |
Quais foram as
maiores dificuldades que você encontrou ao abraçar uma nova profissão?
Ricardo
Lelis:
A minha maior dificuldade ainda é dividir este trabalho com a engenharia. As
duas profissões hoje me dividem, e ainda tenho que arrumar tempo pra ficar com
a família. A convivência com eles me ajuda e me fortalece. Mas não me considero
um luthier. Sou um construtor de guitarras e de sonhos dos clientes. A
profissão luthier é linda e seu conhecimento centenário é muito mais que isso.
Eu ainda chego lá. Estou sempre estudando e me atualizando. Tive e tenho sorte
que meus clientes me ajudam muito neste crescimento. Não dá pra ficar naquele
“mais do mesmo”. Os pedidos mais diferentes, aqueles que você nunca fez, te
desafiam e te fazem crescer. Estou recebendo muitos desses pedidos todos os
dias. Dificilmente nego um trabalho. Desde que a guitarra afine tá valendo.
Quem sou eu para minimizar o sonho de um cliente?
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Wing modelo Les Paul em construção. |
Já apareceu em sua
oficina algum projeto inusitado? Em caso afirmativo para a pergunta, qual foi
esse pedido? Por gentileza, fale um pouco sobre ele.
Ricardo
Lelis:
Inusitado acho que não é a palavra, mas o mais desafiador. Cada época tem o seu.
No início, foi o tampo de um modelo Les Paul, depois a construção de uma Les
Paul completa, multiescalas, a primeira modelo PRS, a primeira corpo inteiriço,
marcações de escala etc. Ultimamente, foi uma guitarra de viagem com o tamanho
de escala de Les Paul, tampo abaulado, headless,
efeitos de distorção e amplificador de fone embutidos. Levou o apelido de
“guitarrinha” pelo tamanho, mas para sua proposta, teve um resultado grandioso.
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Guitarra Wing modelo travel headless. |
O limite da
customização é a funcionalidade do instrumento ou existem outras variáveis?
Ricardo
Lelis:
Nada adianta se a guitarra não afinar. Simples assim. Mas a customização não
passa necessariamente pela ciência e origem das notas musicais, pelo cálculo
matemático de uma escala. Não vamos criar a roda. As variáveis são:
acabamentos, curvas, cores, madeiras, formatos, marcações, elementos e pequenos
detalhes que servem para eternizar pontos que são importantes para o cliente,
além de ser financeiramente viável. A escolha deste conjunto deve soar bem aos
ouvidos e aos olhos de seu dono. O sonho é dele, não é? Isso tem limites? São
estes detalhes que tornam os instrumentos únicos.
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Guitarra Wing com inlay floral. |
Estamos no começo de
2020. Você planeja alguma novidade para este ano?
Ricardo
Lelis:
Além de fortalecer a presença da marca Wing Guitars no mercado, este ano a meta
é lançar um site que facilite para o cliente customizar sua guitarra e enviar o
pedido. Hoje nossas vendas são feitas pelas redes sociais e WhatsApp. Embora o
atendimento seja à distância, trabalho de forma a minimizar este fator deixando
o cliente mais confortável para realizar a compra e dar um passo na conquista
de seu sonho. Você percebe como isso é delicado e de muita responsabilidade? Na
maioria das vezes tratamos de sonhos, e eu não posso fazer nada errado.
Pretendemos com o site agilizar a compra, mas sem perder o vínculo de confiança
e respeito que fornecemos aos nossos clientes. Além disso, outras metas são
construir a primeira archtop e
diminuir o prazo de entrega. Participar como expositor em feiras da área é um
sonho, mas este ano talvez não aconteça ainda, mas quem sabe?
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Violões Wing. |
CONTATOS WING GUITARS
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