Bate-papo com o luthier Carlos Guilherme Prado - Excelsior Guitars

 


Juntando o amor pela música com a habilidade para realizar trabalhos manuais, o luthier Carlos Guilherme Prado fundou a Excelsior Guitars em 2013. Situada no tradicional bairro Ipiranga, na cidade de São Paulo/SP, a empresa vem se destacando no mercado por oferecer ao público modelos clássicos de guitarras e contrabaixos fabricados de maneira artesanal com matéria-prima rigorosamente selecionada. Além disso, ele também desenvolve modelos próprios inspirados nos instrumentos vintage fabricados nas décadas de 50 e 60, ukuleles e cigar box guitars.

Prado falou um pouco sobre sua trajetória como luthier, os produtos e serviços oferecidos pela Excelsior Guitars, madeiras brasileiras que gosta de utilizar, contou alguns detalhes sobre o processo de fabricação e muito mais.

Por Álvaro Silva.

Como a luthieria surgiu em sua vida? Você chegou a fazer algum curso específico?

Toco guitarra desde meados dos anos 90. Meu pai tinha como hobby fazer trabalhos em madeira, como miniaturas de carros, aviões e esculturas. Minha família sempre teve muita habilidade com trabalhos manuais, e sempre tentávamos fazer melhor ou consertar qualquer coisa que víssemos e julgássemos malfeita. 

Juntando o nosso amor pela música com essa habilidade e meu curso técnico em Eletromecânica, em 2005 desafiei meu pai a fazermos uma guitarra. Tiramos o molde da minha Epiphone Les Paul Special, e partimos para a luta. Nem tupia tínhamos, e fizemos as cavidades no formão. A guitarra funcionou, mas tinha obviamente vários problemas de entonação. Isso nos encorajou a fazer uma segunda guitarra, desta vez uma Tele, cujo formato eu havia copiado da guitarra de um amigo. De uma prancha de marupá saíram 02 Teles, uma delas tenho até hoje:

Telecasters.

Essas guitarras ficaram boas, e isso me motivou, em 2010, a ir estudar com o mestre Edilson Hourneaux, da atual Laboratório de Luthieria, e posteriormente com o Vicente Palma, que cedia o espaço ao Edilson para as aulas. O Vicente leciona até hoje na B&H e na Luthieria Bela Vista.

Fiz também um curso de acabamento em goma-laca com o Lucas Caracik, expert em acabamentos naturais e designs autorais.

Em 2013 aluguei um espaço no Ipiranga com um amigo para iniciarmos a Excelsior. Em 2017 essa sociedade se desfez, mas eu sigo sozinho com a oficina e com o nome.


Além da construção de guitarras e contrabaixos, você oferece algum outro tipo de serviço ao público?

Construo cigar box guitars e ukuleles também. Faço pontualmente serviços de setup completo e manutenção, mas não é meu foco. Apesar de eu ter construído uma clientela fiel para esses serviços, não disponho de muito tempo.

Ukulele e cigar box guitar.

O processo de fabricação dos instrumentos Excelsior segue uma linha totalmente old school, isto é, tudo é feito basicamente de forma manual. Isso é uma filosofia da empresa?

Isso foi natural. Como eu disse, no início eu não tinha nem tupia, muito menos serra de fita, furadeira de bancada e lixadeira. aos poucos fui investindo em ferramentas, mas nunca me interessou o CNC. Além do fato de eu não ser competente o suficiente para programar, tem a coisa que a minha família sempre teve, do do-it-yourself

Não odeio nem desprezo os instrumentos feitos em CNC, mas desde muito cedo aprendi a amar o rock clássico, e com isso vieram os instrumentos dos meus ídolos e as técnicas que eram usadas para fazê-los. Cada instrumento tem sua particularidade, pequenas diferenças mesmo entre instrumentos do mesmo modelo, sem mencionar as possibilidades de shape de braço. Cada instrumento da Excelsior passou pelas minhas mãos e foi feito um a um individualmente. Acho que essa é a graça: trabalhar como se trabalhava nos anos 50 e 60, fazendo instrumentos que relembram esta era. Então sim, isso é uma filosofia da marca. 

Processo de fabricação handmade.


Passadas sete décadas de seus lançamentos, por que os modelos tradicionais de guitarras e contrabaixo ainda chamam tanto a atenção do músico?

Essa pergunta também me intriga. Acho que do ponto de vista de design de produto, as guitarras e baixos elétricos são raros exemplos de coisas que foram desenhadas de maneira excepcional já de cara. Muito pouco do que veio depois ofereceu um real avanço, ou propôs um rompimento do que foi feito até 1965.

De cabeça me lembro apenas das pontes Floyd Rose, guitarras e baixos multiscale e circuitos e captadores ativos. 

Os ouvintes e musicistas interessados sempre buscam as origens do que estão ouvindo. Invariavelmente a sonoridade única desses ídolos se torna algo a se atingir. Há sempre um senso de nostalgia com as décadas anteriores.

Acho que tem lugar para tudo, mas a guitarra, sobretudo a Stratocaster, se tornou um arquétipo: qualquer pessoa que é convidada a imaginar uma guitarra, mesmo que não seja musicista ou fã de música, irá pensar nela. Já pensou em como o mundo mudou desde 1954? Já o imaginário coletivo de “guitarra” permanece o mesmo.

Telecaster.

Recentemente você fez réplicas de guitarras famosas, como a Dragon Tele do Jimmy Page e a SG “The Fool” que o Eric Clapton usou na época do Cream, todas elas pintadas fielmente pela Isabella Hohagen.  Qual foi a sensação de recriar instrumentos tão icônicos? Algum deles deu mais trabalho de fazer?

Eu sou fã do Eric Clapton, embora esteja um tanto decepcionado com as recentes declarações dele. Isso à parte, não dá para ignorar a revolução que ele causou nos anos 60. O mesmo pode ser dito sobre o Jimmy Page, Jimi Hendrix e os Beatles, por exemplo.  Essa psicodelia era tanto sonora quanto estética, e nesta época, surgiram instrumentos que se tornaram dignos de exposição em museus. 

Minha proposta com estes instrumentos é reproduzir fielmente esses instrumentos para que os fãs os tenham nas suas coleções, exibam orgulhosamente e os toquem sem medo de danificarem algo que custe uma exorbitância. Um instrumento de luthier é um investimento considerável, mas muito inferior a um instrumento vintage.

A mais difícil, para mim e para a Isa, foi a “The Fool”. Aliás, quero parabenizar essa artista tão talentosa, que vai no detalhe, usa as mesmas cores, tira milhares de fotos e vai explicando cada etapa do processo. Contudo, a “The Fool “e a “Dragon” não foram as primeiras guitarras que fiz pintadas por algum artista. Em 2018, fiz uma Jazzmaster para um cliente americano feita exclusivamente com madeiras brasileiras, e pintada pelo artista de rua Elvis Mourão

SG Eric Clapton "The Fool".


Jimmy Page "Dragon" Telecaster.

Jazzmaster

Você já chegou a desenvolver algum modelo com design próprio?

Sim, e eu adoro fazer isso! Já projetei uma superstrat inspirada nas Kiesel, que não é muito a minha praia, mas foi legal de fazer, um baixo inspirado nos Rickenbacker e uma guitarra inspirada na Tele, mas que permite as mais variadas configurações. Esses dois últimos foram ainda projetados durante a minha sociedade pré-2017, mas adoraria retomar esta proposta: projetar instrumentos novos como se eles tivessem sido projetados nos anos 50 a 70. 



Falando sobre madeiras, você é um entusiasta das espécies brasileiras? Com quais delas você gosta mais de trabalhar?

Sim! O Brasil tem madeiras maravilhosas, e precisamos sempre exaltar isso, pois ainda há muito preconceito e audição discriminatória por aqui. Particularmente gosto de trabalhar com o marupá, freijó e mogno para corpo, e Jequitibá, roxinho, pau ferro, imbuia e ipê para braço e escala. Sou sempre aberto a testar espécies novas, tendo em mente os preceitos básicos para uma boa madeira: estabilidade, facilidade de se trabalhar, peso e beleza.

A Fender usava no início pinus, ash e o maple, que eram abundantes na região da Califórnia. Já a Gibson, usava o mogno e jacarandá importados pela indústria moveleira do Michigan, onde era localizada, além do já mencionado maple. Estas escolhas foram circunstanciais pensando em produção em massa, dada a alta disponibilidade de matéria prima, muito mais do que em sonoridade, creio eu.

Então, já que temos à disposição madeiras excelentes, não vejo por que não usá-las e exaltá-las.


Alguma novidade programada para este ano?

Este ano estou focado na obra da minha casa, que abrigará a nova oficina, ainda no Ipiranga em São Paulo. Pretendo seguir com os instrumentos exclusivos e temáticos, como foi o caso da SG Starman, que teve a colaboração incrível do Anderson da AZ Hand Engraving.

SG Starman.

Além disso, pretendo seguir com as parcerias com a Isa Hohagen, Christian Bove Custom Hardware, AZ Hand Engraving e o Edu da Fullertone, que faz a maioria dos captadores dos meus instrumentos. 


Maiores informações no Facebook e Instagram da Excelsior Guitars.



Comentários

  1. Fabuloso. Criativo.
    Parabéns pelos trabalhos já efetuados, e pelas ideias para projetar.
    Logo vou encomendar a minha.
    Abraços.
    Eugenio.

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    Respostas
    1. Obrigado pelas palavras, Eugênio!

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  2. Parabéns cara orgulhoso de você sucesso pra ti

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  3. Parabéns cara orgulhoso de você sucesso pra ti

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  4. Parabéns meu amigo!!! Fabricante de sonhos!!!

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  5. Baita orgulho, meu amigo!
    Siga em frente!!!

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  6. Maravilhosa entrevista! Parabéns ao blog Guitarras Made in Brasil e ao Carlos, pelos instrumentos cheios de personalidade e sonoridade! Uma honra ver meu trabalho presente neles!

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