Bate-papo com o luthier Paulo Penteado (Mundo das Cordas e Métis Custom Guitars)


Alô, alô, leitores e leitoras!


Nesta nova edição da seção Bate-Papo, entrevistamos o luthier belo-horizontino Paulo Penteado, responsável pela oficina Mundo das Cordas Luthieria, atuante no mercado de assistência técnica e construção de instrumentos de corda há oito anos. Além da Mundo das Cordas, recentemente ele desenvolveu dois novos projetos: uma marca de guitarras custom – a Métis e o “Quero Ser Um Luthier”, voltado ao ensino da luteraria. Na entrevista, ele também nos contou um pouquinho sobre seu cotidiano profissional.
Registramos aqui nossos sinceros agradecimentos ao luthier Paulo Penteado pela participação e confiança em nosso projeto.    


Pintura feita pelo Mundo das Cordas
Guitarras Made In BraSil (GMB): Você atua como luthier e administrador da oficina Mundo das Cordas Luthieria há um bom tempo. Como surgiu a ideia de desenvolver uma linha de guitarras custom, no caso a Métis? Foi devido a algum tipo de insatisfação com os instrumentos “de fábrica” disponibilizados no mercado?

Paulo Penteado (PP): Não só por isso, mas também pelo desejo do público em ter instrumentos exclusivos e singulares. O mercado também teve grande influência nisso, pois muitos fabricantes optaram em produzir seus instrumentos na China utilizando material de baixo custo e de qualidade questionável, fazendo com que o público, principalmente o músico profissional, busque um luthier que tenha um trabalho sólido e confiável.  Além dessa questão da queda de qualidade na produção dos grandes fabricantes, acredito que o fator principal é o desejo de se ter um instrumento feito realmente à mão por um artesão luthier, pois até mesmo o mais leigo sabe que as mais nobres marcas perderam a essência da "mão em um instrumento" e isto faz muita falta.


(GMB): O músico brasileiro, seja ele profissional ou amador, abraçou a ideia de ter um instrumento personalizado? Como anda o mercado nacional de guitarras custom?

Tele Métis p/ Alexandre da Mata
(PP): Está abraçando. Ainda existe aquela desconfiança tradicional de abrir mão de uma
marca reconhecida há anos e escolher uma guitarra custom feita pelo luthier, e percebo tal atitude principalmente com os amadores e iniciantes. Eles ainda vivem o "fetiche da logomarca", já os realmente profissionais e experientes, reconhencem o valor de uma renomada marca, mas sabem que somente um luthier qualificado pode ir além do que é oferecido no grande mercado. Vejo que no atual momento os músicos profissionais são os que realmente movem o mercado de guitarras custom, o que é muito bom, pois em longo prazo, creio que até mesmo os leigos vão deixar de endeusar somente as marcas tradicionais e industriais, porque são os músicos profissionais que influenciam os leigos a comprarem aquilo que eles usam.


(GMB): Existe muita rivalidade entre os profissionais do ramo?

(PP): Especificamente em Belo Horizonte, sinto um clima de hostilidade entre os luthiers. É um a profissão que mexe muito com o ego do indivíduo, caso o profissional não tenha cuidado consigo, ele começa a se sentir maior e melhor que todos. Tento destruir essa cultura, mas é muito difícil. Parece estar enraizado na alma dos profissionais daqui, mas acredito que quando todos do ramo perceberem que temos mais a ganhar sendo parceiros do que concorrentes ferozes, talvez a luz venha à tona.    

Guitarra Métis

(GMB): Você também desenvolve um projeto de ensino de luteraria chamado “Quero Ser Um Luthier”. Qual é a proposta desse projeto?

(PP): A proposta inicial foi esclarecer e informar o grande público. Meu objetivo é quebrar esse tabu "estabelecido" entre os luthiers de que nada pode vazar do seu atelier e que tudo deve ser guardado a sete chaves. Quem sofre com essa atitude é o público e os próprios profissionais que se acham detentores de poderes mágicos secretos, pois a omissão extrema de informação não enfraquece a vontade de um indivíduo de ser um luthier ou qualquer coisa que seja; eis aí a pior coisa! Mesmo sem informação alguma, nem mesmo a mais básica, muitos se arriscam a se tornarem "luthiers" (eu os chamo particularmente de "fuciers"). Desta forma, o mercado fica poluído de pessoas terrivelmente antiprofissionais, mas que não deixam de ter boa vontade. O público que não sabe realmente a profundidade da profissão se decepciona ao ter sucessivas experiências desagradáveis quando cai nas mãos de “fuciers”, ou seja, tanto o verdadeiro profissional quanto o cliente saem perdendo, pois, o último, tende a culpar a atividade em si, e justamente por esconder o que sabe, o primeiro se torna vítima de si mesmo.

(GMB): Quais são as maiores dificuldades enfrentadas no cotidiano profissional?

Métis Explorer
(PP): No início com certeza é a dificuldade de encontrar material didático de qualidade. Para
se ter conhecimento em nosso ramo é preciso muito estudo, altos gastos e “tentativas e erros”. Outra grande dificuldade é a desinformação do público, que em sua grande maioria, não entende e não reconhece a luteraria como uma profissão séria e que exige muito do profissional. Muitos acham certos serviços caros e chegam a comentar que é um absurdo cobrar “x” valor para uma "simples troca de trates". Hoje em dia quando isso acontece, eu levo o cliente para dentro da minha oficina e faço questão de explicar o passo a passo do serviço, os maquinários utilizados, preços de material, etc. Falo também sobre como é difícil ter ferramentas precisas para o trabalho e explico que para fazer um serviço de alta qualidade, o profissional leva anos e anos de estudo sério. Quando faço isso, os clientes até dizem que na verdade o serviço chega a ser barato.


Métis Strato
(GMB): Nesses seus anos de profissão, qual foi o caso/serviço mais inusitado ou engraçado que já passou pela sua oficina?

(PP): Existem muitos, mas um em particular não sai da minha memória. Certo dia, um cliente levou um violão Eagle GL6 para uma regulagem.  O serviço foi feito e entregue no prazo. Quando o cliente testou o instrumento, disse que estava ótimo, pagou e foi embora. Após um pequeno período de 2 a 3 horas, ele voltou no atelier vermelho de raiva, super agitado e aos berros. Perguntei a ele o que tinha acontecido, ele me disse que eu não tinha feito nada em seu instrumento, afirmava que eu o enganei. Eu disse a ele que ele tinha testado o violão e tinha gostado do serviço, mostrei a ele tudo o que foi feito em detalhes, mas nada adiantava. Até que então ele me disse: "- Cara, eu cheguei em casa e coloquei o CD do André Valadão e o som do meu violão não estava igual ao dele, eu queria regular o violão para ter o mesmo som do André Valadão". Daí foi um custo explicar pra ele que o CD era produzido, que ele tinha um violão de outra marca, outra madeira e que o serviço de regulagem não alterava em nada na estrutura sonora do instrumento e que isso depende da madeira, marca, tipo de fabricação e etc. Ele ficou mais de 2 horas na minha oficina até que foi embora ainda insatisfeito.
Ser luthier não é fácil!

Luthier Paulo Penteado e uma guitarra Métis



CONTATOS LUTHIER PAULO PENTEADO/MUNDO DAS CORDAS LUTHIERIA/MÉTIS CUSTOM GUITARS





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