Luthieria e Sustentabilidade: Conheça o trabalho de Pedro Machado (Eco Guitar)
Fundada oficialmente em 2017, na cidade de São Paulo, a Eco Guitar surgiu a partir de uma proposta ousada de seu fundador - o luthier Pedro Machado: em um mercado cercado de lendas e preconceitos, ele decidiu focar no desenvolvimento de ações sustentáveis ao trabalhar apenas com madeiras brasileiras provenientes de demolição e reflorestamento.
Além da questão da sustentabilidade, a empresa preza pela exclusividade.Todos os instrumentos são únicos e seguem as características desejadas pelo cliente. Outra característica importante da Eco Guitar é o incentivo ao produtor local, utilizando componentes fabricados no Brasil sempre que possível.
Atualmente a empresa oferece ao público fabricação de instrumentos de cordas sólidos, acústicos e semiacústicos, regulagens e customizações e cursos de luthieria.
Durante a entrevista, o luthier Pedro falou sobre como
ingressou na profissão, detalhou as propostas e diferenciais da empresa, falou
sobre madeiras, planos para o futuro e muito mais.
O que te levou a ser luthier? Faz muito tempo que você iniciou na profissão?
Sempre gostei de trabalhos manuais e resolvi juntar a minha paixão pela música com a reutilização de materiais para ajudar a fortalecer o cenário nacional de instrumentos musicais com algo diferente.
Iniciei
na luthieria há 13 anos. Estagiei um ano com um dos precursores da luthieria no
país, o Ladessa. Ele me ensinou muito sobre eletrônica e construção de uma
forma bem lúdica, sem gabaritos e com muita conta e suor. A frase que ele mais
falava era: “- Amorew, vai lixar que isso aqui
tá muito ruim” (risos).
Quando a Eco Guitar foi fundada?
Em
dezembro de 2017 decidi dar total atenção a Eco. Ela começou antes disso, mas
esse foi o lançamento oficial com o primeiro curso de construção.
Podemos definir a missão como a razão de ser da empresa, isto é, o objetivo pelo qual ela existe e que norteia todas suas ações. Qual é a missão da Eco Guitar?
A Eco tem como missão promover a diversidade e proporcionar experiências únicas para as pessoas através de cursos e encomendas personalizadas, utilizando madeiras exclusivamente brasileiras e tentando usar o máximo de peças produzidas no país.
Infelizmente,
nós nos acostumamos a simplesmente importar produtos prontos e paramos de
sonhar. A ideia é devolver a capacidade do instrumentista, seja ele
profissional ou hobbysta, de criar o próprio instrumento, atendendo suas reais
necessidades.
Atualmente quais são os produtos/serviços oferecidos pela Eco Guitar?
Oferecemos
regulagens e fabricamos sob encomenda. Também temos cursos
de construção
de sólidos, semi-sólidos e acústicos. Eles podem ser feitos presencialmente ou
online.
Qual é a importância do desenvolvimento de ações sustentáveis no exercício da luthieria?
A
sustentabilidade não se dá somente pela escolha e melhor aproveitamento das
madeiras, é um modo de vida. Começamos a produção dos instrumentos tendo 100%
das madeiras provenientes de reúso, mas como o preconceito foi grande no
começo, tivemos que trazer as madeiras de reflorestamento para o time. Aliás, o
que também foi ótimo, pois nos proporcionou experimentar madeiras diferentes
como tauari, jequitibá, eucalipto, cumarú, ipê e outras.
Além da utilização de madeiras provenientes de demolição e reflorestamento, quais outras medidas ligadas à sustentabilidade você adota nos processos de sua empresa?
Nós tentamos comprar serviços e produtos o mais próximo possível da oficina. O dinheiro gasto vai ajudar a manter esses estabelecimentos e pode até desenvolvê-los, melhorando o serviço e criando novas vagas de emprego. É também uma forma de evitar o deslocamento para outras áreas, diminuindo o trânsito, o stress pessoal e o desgaste ambiental.
Nós tentamos reciclar o máximo possível dos insumos utilizados. Também aplicamos acabamento com óleo e cera, pois são mais ecológicos, isto é, geram menos resíduos.
Não compramos projetos prontos, ou seja, financiamos para que alguém desenhe esses projetos, gerando renda e expertise para o país.
Também trabalhamos sob encomenda, diferentemente de outras empresas que inundam o mercado de produtos sem ter uma demanda específica.
Além
da questão ambiental, acreditamos na empatia e na solidariedade. Por isso,
ajudamos a ONG Casa das Flores (uma organização não governamental que auxilia
mulheres egressas do sistema carcerário) e o Projeto Acolher (uma ONG que cuida
de animais abandonados. Parte da nossa renda vai para esses projetos.
A madeira de demolição necessita de algum cuidado especial para ser utilizada na fabricação dos instrumentos? A escolha das peças precisa ser mais rigorosa?
Nós vamos bem na contramão do que o mercado e as pessoas fazem, então utilizamos qualquer madeira para a construção de instrumentos sólidos. Desta forma, podemos desmistificar a ideia de que só as madeiras de renome são boas para instrumento.
Já fizemos um teste cego com cerca de 100 pessoas, pegamos uma miniguitarra que fizemos e gravamos um som dela limpo e outro distorcido. Fizemos a mesma coisa com uma Gibson Custom. Resultado: a miniguitarra ganhou no som limpo e a Gibson ganhou no som distorcido. A miniguitarra foi feita somente com madeira de descarte e foram usadas peças mais baratas em sua composição.
Estamos
tão obcecados com “agudinho de captador” que nos esquecemos que o músico é quem
faz o som, ist é, às vezes esquecemos o fator humano e nos preocupamos
meramente com aspectos materiais. Acho que em algum momento invertemos as coisas.
As pessoas consomem cada vez mais equipamentos e guitarras, mas se esquecem do
primordial que é curtir o seu som, o seu instrumento.
Além da questão da sustentabilidade, quais são os diferenciais da Eco Guitar?
Aqui vocâ traz o sonho e nós ajudamos a torná-lo realidade! Construímos qualquer instrumento de corpo sólido e semi-sólido. Você pode personalizar tudo e ter a satisfaçao de possuir ou construir um instrumento único no mundo.
Quem faz o curso tem um momento de contato consigo mesmo, a pessoa se desliga da correria do dia a dia. Conseguimos aproximar o aluno do trabalho artesanal, sentir a textura e o cheiro da madeira. O aluno sai transformado dessa experiência e ainda leva um instrumento único, conhecimento e uma história para contar para seus amigos. Já teve até ex-jogador de futebol que fez o curso, o Zé Elias (veja o video aqui)
Outro detalhe bem legal é a possibilidade de fazer qualquer tipo de instrumento, ou seja, um modelo de instrumento que chega a custar R$40.000,00 por aí, você pode fazer um similar no curso pagando bem menos. Lembrando que o curso tem caráter didático e inclusivo.
Um dos diferenciais é que acreditamos que o que mais toca no coração são as histórias que vivenciamos com os alunos. Uma muito bacana, por exemplo, foi a de um aluno que estava passando por um período muito difícil de depressão. Através do curso ele passou a se relacionar novamente com as pessoas e voltou a sonhar.
Muitos
alunos acabaram ingressando na profissão de luthier por gostarem da
experiência, ou seja, são muitos os diferenciais, tanto para os clientes quanto
para nós.
Existe preconceito com relação à utilização da madeira de demolição e de reflorestamento na construção de instrumentos musicais?
Bastante. Os EUA estão martelando que as madeiras, método de construção e peças deles são as melhores há mais de 70 anos. Acabamos crescendo com a ideia de que se você não usar um determinado tipo de madeira ou de peça, você não vai alcançar o som desejado. A Eco vai justamente na contramão disso para provar que é possivel ter um excelente instrumento e ainda sim ser sustentável.
A
propósito, o guitarrista Tiago Jardim fez um vídeo muito interessante
comparando nossa guitarra com duas Fenders (veja aqui) e fez um review sobre uma Telecaster que construímos
(veja aqui).
Em alguns projetos você utiliza madeiras não convencionais nos instrumentos. Quais delas te surpreenderam positivamente? E negativamente?
Só
tivemos surpresas boas nessa caminhada. Já usamos pinus, pinho-de-riga, araucária,
muiracatiara, jequitibá, imbuia, ipê, cumarú, mogno, coração-de-negro, cedrinho,
cambará, canela, caxeta, freijó, cedro-rosa, cedro, cerejeira, angico, angelim,
angelim-pedra, roxinho, eucalipto, peroba, tauari, marfim, jacarandá, sucupira
e outras tantas. A lista vai longe…
É possível utilizar outros materiais além da madeira para confeccionar braços e corpos de guitarras, contrabaixos e violões? Você já experimentou?
É
possível fazer instrumentos em impressora 3D utilizando plástico, por exemplo. Dá
pra fazer braço em fibra de carbono, resina e acrílico, mas nunca me interessei
por esses materiais, já que alguns dos materiais citados fogem da nossa ideia
de sustentabilidade por serem materiais que prejudicam o meio ambiente.
Entretanto, existem muitas alternativas para serem testadas sem prejudicar o
meio ambiente.
Quais são os planos para o futuro?
Estamos
passando por uma transformação importante neste final de ano. Estamos para
lançar a primeira filial da Eco Guitar. Ela funcionará na Praia Grande com o Thiago
que já é nosso parceiro há um tempo. A ideia é a expandir a marca levando para
o litoral nossos cursos, instrumentos e serviços.
Estão chegando para o time mais duas pessoas: o designer Pedro e o luthier Beto, profissional com experiência na Flutter Guitars. Desta forma, poderemos abrir a gama de produtos e serviços.
Vamos
lançar modelos nossos em parceria com a Flutter e a Evil. Serão guitarras, baixos,
violão de nylon e outros acústicos. Além disso, vamos vender os gabaritos e jigs
que o pessoal tanto pede.
Maiores informações no site,
Facebook,
Instagram
e YouTube
da Eco Guitar.
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